Por Assessoria de
Comunicação da Comissão Pró Índio (CPI/AC)
Fortalecer o trabalho
dos agentes agroflorestais indígenas (AAFIs), em temas relacionados à cultura,
a autonomia e a segurança alimentar no Alto Juruá. É com esse objetivo que a
Comissão Pró-Índio do Acre (CPI/AC), em parceria com a Associação Kaxinawá do
Rio Breu - AKARIB e a Associação do Movimento dos Agentes Agroflorestais
Indígenas do Acre - AMAAIAC, com apoio da FUNAI, realizarão de 02 a 14 de abril
na aldeia Vida Nova - Terra Indígena Kaxinawá/Ashaninka do Rio Breu - o
seminário: "A gestão territorial e ambiental das terras indígenas na faixa
de fronteira e o I Intercâmbio de sementes tradicionais do Alto Juruá". A
atividade faz parte do projeto "Gestão Indígena no Acre", que conta
com patrocínio da Petrobras por meio do Programa Petrobras Socioambiental.
A proposta é promover
estratégias de articulação e troca de experiências sobre o uso, o manejo e a
conservação da agrobiodiversidade e a gestão territorial e ambiental dasterras
indígenas e as comunidades do entorno (RESEX Alto Juruá e comunidade Ashaninka
do lado Peruano).
Pretende-se envolver
lideranças destas comunidades, professores, agentes agroflorestais, agentes de
saúde, artesãs, estudantes, AAFIs de povos indígenas da região do Juruá –
Ashaninka, Jaminawa Arara, Katukina, Poyanawa, Nukini e moradores da RESEX Alto
Juruá. Representado nove terras indígenas e uma unidade de conservação do Vale
do Juruá. Será uma atividade no âmbito da formação dos AAFIs e consequentemente
permitirá reflexões com a comunidade sobre as ações práticas relacionadas ao
uso, manejo e conservação da agrobiodiversidade na TI Kaxinawá/Ashaninka do Rio
Breu, seu entorno.
Conforme cita Marcos
Catelli, coordenador do Programa de Gestão Territorial e Ambiental da CPI/AC:
Todas as ações que os AAFIs desenvolvem com relação ao manejo da produção nos
roçados tradicionais, quintais agroflorestais, Sistemas Agroflorestais (SAFs),
fortalecem a segurança e a soberania alimentar no sentido da autonomia dos
povos com relação às sementes e ao uso dos recursos naturais. O acompanhamento
é no intuito de fortalecer essa ação para incrementar e melhorar a segurança
alimentar dentro das aldeias. Uma produção agroecológica, sem defensivos
químicos, sementes híbridas e transgênicas ou adubos industrializados. A
finalidade é criar um espaço de troca de saberes entre os povos indígenas e
tradicionais, guardiões das sementes nativas e da biodiversidade da região do
Alto Juruá, com o objetivo de fortalecer a autonomia produtiva e a soberania
alimentar.
AAFIs realizando troca de sementes durante Seminário realizado
no Centro de Formação dos Povos da Floresta. Foto: Marcos Catelli, agosto de
2012.
O intercâmbio visa
também valorizar um conhecimento milenar, repassado por gerações e que está
cada vez mais ameaçado no Acre e no Brasil, devido a política atual que
supervaloriza o agronegócio e o uso da biotecnologia em detrimento das sementes
crioulas, tradicionais. Desta forma, discutir as estratégias e compartilhar as
experiências exitosas na gestão do território, de seus recursos naturais e na
conservação de suas tradições, torna-se então mais que necessário e este é o
objetivo deste encontro.
Ruinete Sereno, agente
de saúde da aldeia Jacobina I, TI Kaxinawá/Ashaninka do Rio Breu, no depoimento
abaixo aborda um pouco da relação da saúde da comunidade com a segurança
alimentar: Na escola não usamos mais os enlatados do branco, aplicamos o
recurso da escola na própria merenda. O trabalho de agente de saúde tem muita
relação com uma alimentação segura e diversificada. Estou fazendo formação e
pesquisa na aldeia para fortalecer o conhecimento sobre a medicina tradicional
e o uso dos alimentos para garantir a saúde. A gente tem que plantar bastante
para alimentar a família porque ali o nosso alimento é o nosso remédio, nosso
remédio é o alimento. O que você come afeta na saúde. Alertar a família que o
que come é o que é nosso remédio. É esse trabalho que a gente faz na aldeia, se
a gente não comer um tipo de legume, a gente fica fraco, o trabalho que a gente
faz nas sementes, as mulheres são importantes, elas fazem a seleção das
sementes e a gente vai plantando.
O envolvimento das
comunidades do entorno da TI é importante, como cita o AAFI Aldemir Matheus da
aldeia Vida Nova - TI Kaxinawá/Ashaninka do Rio Breu, falando sobre a
comunidade de indígena do lado peruano, que fica em frente a sua aldeia: Os
parentes do Peru na agricultura deles, produzem muito feijão, arroz e milho,
trabalham direto. Mas, nos plantios deles estão usando muito produto químico, a
semente já vem com remédio, tem cor diferente. Fazem roçado, brocam e jogam
veneno, depois colocam fogo, jogam outro veneno e depois vão plantar. Eles
avisaram que fizeram um roçado e pediram para não andar lá porque tinham
colocado veneno para matar os predadores. Na produção deles tem animais, como
graúna, que gosta de mexer, ela come e morre, aí o animal se alimenta de
graúna, morre também, aí o urubu come, morre também. No inverno tomam água da
cacimba, mas quem não tem cacimba bebe água do rio. Mas, no verão o rio fica
poluído das químicas e a gente fica doente. É importante divulgar essa história
porque é preocupante, porque na aldeia não se usa veneno e não se usa a semente
híbrida.
Produção agroecológica da aldeia Belo Monte, TI Kaxinawá do Rio Jordão.
Foto: Victor Reyes, novembro de 2011.
As sementes locais
(pré-colombianas, nativas, crioulas) melhoradas e conservadas pelas famílias
indígenas agricultoras ao longo de séculos, adaptadas às suas condições de solo
e clima, às suas práticas tradicionais de manejo e preferências culturais,
constituem um patrimônio da biodiversidade. Essas sementes são essenciais para
a reprodução da agricultura indígena e a segurança e soberania alimentar nas
aldeias independentes de recursos alimentícios externos à terra indígena, além
de representarem a segurança de que os agricultores indígenas terão sempre as
suas sementes no momento certo de plantar. Os temas que serão tratados nesse
encontro juntos aos povos indígenas e tradicionais na TI Kaxinawa/Ashaninka do Rio
Breu tem papel importante, especialmente para a agricultura familiar, pelos
benefícios econômicos e os relativos à segurança alimentar e à qualidade de
vida. Também traz a garantia de qualidade do alimento para o consumidor. Se
estas são vantagens imediatas, é fundamental seu papel estratégico, de longo
prazo, na conservação do meio ambiente, pela construção de um modelo
sustentável de produção e os AAFIs são pessoas chave nessa discussão.
O AAFI Aldenir Paulino
da TI Kaxinawá do Rio Jordão enfatiza a contribuição de seu povo para a
preservação das sementes tradicionais, no que toca também a fortalecer as
práticas tradicionais de manejo, as relações entre as gerações, temas que são
debatidos nos intercâmbios e demais atividades de formação: Para os Huni Kuĩ e
para todas as populações do mundo, as sementes tradicionais tem uma grande
importância para fortalecer a comunidade na segurança alimentar. É assim para
cada família, e nos roçados, quem não tem alguma variedade de semente
geralmente pega as sementes com os outros da comunidade nas aldeias, trabalham
também em parceria com os AAFIs das outras aldeias, ensinando para os mais
novos e aprendendo com os mais velhos.
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